Após identificar possíveis desvios em emendas parlamentares destinadas à saúde, o governo federal exige que municípios devolvam mais de R$ 140 milhões.
Dados de 51 auditorias do DenaSUS, órgão do Ministério da Saúde, mostraram que as principais irregularidades estão no Maranhão, onde cerca de R$ 120 milhões estão sob cobrança.
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As investigações revelam que diversas cidades receberam valores superiores ao permitido para emendas, por conta de registros artificiais de procedimentos do SUS.
O cálculo do limite de recursos para cada município leva em conta esses dados, o que favoreceu o recebimento indevido.
Foco em Vitorino Freire e a Operação Hygeia
O município de Vitorino Freire (MA), administrado por aliados do deputado federal Juscelino Filho (União Brasil-MA), concentra a maior cobrança: R$ 13,4 milhões.
Segundo auditoria, a prefeitura não comprovou mais de 800 mil consultas informadas em 2021, embora tenha população de cerca de 30 mil habitantes.
Esse montante equivale a quase metade dos R$ 27 milhões repassados à cidade em 2024, incluindo emendas parlamentares.
A Polícia Federal investiga se houve crime na gestão desses recursos e se houve desvio de parte do dinheiro, referente a emendas de Juscelino Filho, para uma empresa sem comprovação de serviços, por meio da Operação Hygeia.
As auditorias constataram ainda que senhas de acesso ao sistema de registro do SUS foram repassadas a terceiros, inclusive pessoas sem vínculo com as prefeituras.
Em Bom Lugar (MA), o ex-secretário de Saúde relatou ter solicitado ajuda de Roberto Rodrigues Lima por não dominar o sistema, já que ele era “conhecido da administração anterior”.
Roberto Lima foi alvo de operação da PF em 2022, suspeito de inserir informações falsas no sistema do SUS para justificar repasses a municípios.
No mesmo período, ele aparece como autor de pedidos de distribuição de R$ 36,2 milhões em emendas para cidades do Maranhão, segundo registros do Congresso.
Outros municípios e novas suspeitas
A segunda maior cobrança, de R$ 10,3 milhões, recai sobre Paulo Ramos (MA). As suspeitas incluem repasse sem justificativa à empresa Center Med.
A Polícia Federal investiga a Center Med após interceptações que indicam negociação de emendas com suposto sócio oculto e o deputado federal Cleber Verde (MDB-MA).
“Apresentei ao STF as informações que acredito serem esclarecedoras sobre as emendas mencionadas”, afirmou o deputado ao jornal Folha de S.Paulo.
O deputado ainda declarou que as emendas ajudaram” no atendimento e na ampliação das ações de saúde nos municípios mencionados”.
A Center Med negou qualquer irregularidade, declarou não participar do registro de dados do SUS e afirmou ter sido contratada regularmente para fornecimento de materiais.
O Ministério da Saúde informou que concentrou as auditorias no Maranhão, após solicitação do Ministério Público Federal (MPF), que passou a investigar o tema depois de reportagens publicadas em 2022.
Os relatórios de auditoria, acessados pela Folha por meio da Lei de Acesso à Informação, mostram que R$ 12,19 milhões já foram devolvidos.
Nos demais casos, as cobranças seguem em análise pelo TCU ou aguardam resposta dos municípios.
O Ministério da Saúde, em nota, afirmou que retomou auditorias presenciais em 2023 e atua em parceria com outros órgãos de controle.
“O total auditado no ano passado está na ordem de R$ 8 bilhões”, disse a pasta.
Investigações sobre irregularidades em emendas tem alcance nacional
Entre os 51 relatórios, 23 referem-se a cidades do Maranhão. O Amapá também está na lista, com cobrança de R$ 6,8 milhões após não comprovar 720 mil radiografias de tórax em hospital com apenas dois aparelhos ativos.
São Paulo aparece em seguida, com tentativas de reaver R$ 1,8 milhão de cinco municípios.
Grande parte das irregularidades ocorreu entre 2019 e 2022, período de aumento significativo das emendas parlamentares.
Em situações como a de Nova Luzitânia (SP), a ausência de comprovação de produção em 2018 permitiu o recebimento de R$ 662 mil em anos seguintes por meio de emendas.
Citados negam envolvimento ou irregularidades nos repasses das emendas
As prefeituras citadas negam irregularidades e alegam melhorias nos processos de registro dos dados do SUS.
A Prefeitura de Vitorino Freire afirmou que o volume de atendimentos questionados foi real, impulsionado pela demanda durante a pandemia de covid-19, e atribuiu falhas a uma empresa terceirizada, tendo devolvido R$ 4,6 milhões à União após acordo com o MPF.
O MPF declarou que o acordo não impede novos pedidos de ressarcimento por parte da União.
O deputado Juscelino Filho argumentou que a investigação da Operação Hygeia “não guarda qualquer relação” com suas emendas e que a responsabilidade pela execução dos recursos é dos municípios.
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A Prefeitura de Caxias (MA) informou que ainda não há decisão definitiva sobre o valor cobrado e contestou o relatório da auditoria, ressaltando que também cabe à União fiscalizar os repasses.
“Quem autoriza o pagamento desses recursos? Eles não despencam do Universo”, disse a gestão municipal para o DenaSUS.
Lago dos Rodrigues (MA) declarou não ter recebido notificação sobre a cobrança e atribuiu possíveis falhas à administração anterior. As demais cidades mencionadas na reportagem não apresentaram manifestação até o momento.
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