Líderes ianomâmis denunciam, em carta, omissão da gestão Padilha na saúde

Líderes ianomâmis denunciam, em carta, omissão da gestão Padilha na saúde

Líderes de sete associações ianomâmis enviaram uma carta ao governo Lula para criticar a atuação do Ministério da Saúde e da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) no Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Ye’kwana (DSEI-YY). As reclamações incluem acusações de negligência, falta de clareza na gestão e ausência de autonomia nas decisões locais. O material foi divulgado pelo portal Metrópoles.

+ Leia mais notícias de Política em Oeste

O documento revela que o ministério liderado por Alexandre Padilha (PT) centraliza processos de contratação por meio da Agência Brasileira de Apoio à Gestão do SUS (AgSUS), limitando a participação da coordenação do DSEI-YY em Boa Vista (RR). Segundo os líderes, a escolha dos profissionais ocorre em Brasília, e o órgão local apenas recebe listas para entrevistas, o que comprometeria a autonomia administrativa.

Autonomia e transparência sob questionamento por líderes ianomâmis

Na carta, os representantes afirmam: “Constata-se a ausência de autonomia administrativa e gerencial por parte do DSEI-YY, o qual, na prática, encontra-se impossibilitado de realizar contratações para cargos de confiança, medida indispensável à construção de uma política de saúde efetiva e culturalmente adequada”.

Por meio de nota, o Ministério da Saúde afirmou que a coordenação local participa do processo e que o modelo de seleção segue orientações do Ministério Público do Trabalho e do TCU.

“A seleção em curso de trabalhadores para o DSEI Yanomami atende às recomendações do Ministério Público do Trabalho (MPT) e Acórdão do TCU para adequação do modelo de contratação desses profissionais”, afirmou a pasta. “Os editais da Agência Brasileira de Apoio à Gestão do SUS foram construídos conjuntamente com os dirigentes do território e com a participação do controle social (Condisi), que mantêm atuação ativa no processo e autonomia na definição dos critérios de seleção.”

As lideranças ainda denunciam a inexistência de informações claras sobre a saúde na Terra Indígena Yanomami, contratação de novos servidores e agentes indígenas, além da falta de transparência nas avaliações dos profissionais.

“Não sabemos se essas avaliações estão sendo feitas, como estão sendo feitas, com qual frequência e parâmetros”, diz o texto. “Tal omissão compromete a nossa fiscalização da qualidade dos serviços prestados, tornando a gestão do DSEI-YY não apenas ineficaz, mas também refém de uma lógica de invisibilidade institucional que subverte o propósito de descentralização da política pública de saúde indígena.”

Obras paradas e dúvidas sobre serviços

Além disso, o grupo relata ausência de informações sobre o centro de saúde de Surucucu, em Alto Alegre (RR), iniciativa apoiada pela Central Única das Favelas (Cufa), Frente Nacional Antirracista, sociedade civil, empresas e governo. O ministério informou que a entrega está prevista para setembro. Outro apontamento refere-se à paralisação das obras da Casa de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Casai-YY), em Boa Vista.

Os líderes cobram detalhes sobre as atividades, abrangência e estrutura do centro de saúde. “Não sabemos seu nível de complexidade no atendimento, sua abrangência territorial, sua data de inauguração e sua previsão de recebimento de materiais hospitalares e suprimentos. Não sabemos nem mesmo o nome do empreendimento!”, disseram os representantes.

Segundo a carta, a empresa Voare Táxi Aéreo, controlada pela deputada federal Helena da Asatur (MDB-RR) e Renildo Evangelista Lima, estaria monopolizando os serviços de remoção aérea e transporte de insumos na região. Ambos são investigados pela Polícia Federal, conforme divulgado pelo portal Metrópoles. O Ministério da Saúde declarou que segue a Lei de Licitações para as contratações.

Os representantes alegam que a Voare aplica multas ao DSEI por atrasos de pagamento, agravados pela demora na liberação da Lei Orçamentária Anual. A reportagem do Metrópoles revelou que a empresa recebeu R$ 271 milhões em contratos desde o início do atual governo, sendo R$ 96 milhões sem licitação, o que representa 35% dos acordos.

Manual de atendimento e crise humanitária na Terra Yanomami

O grupo destaca também que o Manual de Atendimento aos Indígenas Expostos ao Mercúrio, elaborado pela Fiocruz e os ministérios dos Povos Indígenas e da Saúde, permanece sem implementação prática. Os profissionais não receberam treinamento e o documento ainda não resultou em mudanças de conduta em campo.

A carta alerta para o esgotamento dos recursos emergenciais destinados à crise humanitária na Terra Yanomami e cobra uma reestruturação do DSEI-YY, com retorno ao modelo descentralizado de gestão.

“Importa ressaltar que os recursos emergenciais alocados para a crise humanitária na TI Yanomami já se encontram esgotados, sem que tenha sido estruturada qualquer resposta duradoura para o atendimento da saúde. Diante desse quadro de desorganização e negligência, é imperativo que se promova a reestruturação do DSEI-YY, com o retorno ao modelo descentralizado de gestão baseado na experiência acumulada pela Saúde Urihi e outras conveniadas”, defenderam os líderes.

Assinam o documento presidentes das principais associações ianomâmis e ye’kwanas, incluindo Davi Kopenawa Yanomami (Hutukara), Carlinha Lins Santos (Kumirayoma), Júlio David Magalhães Rodrigues (Wanasseduume), Waihiri Hekurari Yanomami (Urihi), João da Silva Figueiredo (Rio Cauaburis), Tancredo Kepropeteri Yanomami (Parawami) e Zé Gadilha Xamatawteri Yanomami (Kurikama).

Resposta do governo e evolução dos atendimentos

No ano passado, o Ministério da Saúde decretou estado de emergência na Terra Yanomami por causa do avanço do garimpo ilegal e ao agravamento da crise humanitária, marcada por desnutrição, malária e covid-19. Uma força-tarefa foi criada, reunindo ministérios dos Direitos Humanos, Povos Indígenas e Defesa.

O ministério informou que, desde a decretação da emergência, ampliou em 158% o número de profissionais no território ianomâmi, passando de 690, em 2023, para mais de 1,7 mil em 2024, e investiu R$ 256 milhões em infraestrutura. Sete polos-base foram reabertos, totalizando 37 em funcionamento, além de obras na Casai.

O Centro de Referência em Saúde Indígena de Surucucu tem entrega prevista para setembro deste ano, enquanto a Unidade de Retaguarda Hospitalar dos Povos Indígenas, vinculada ao Hospital da Universidade Federal de Roraima, está em operação desde abril.

Segundo o Ministério da Saúde, as ações resultaram em queda de 21% nos óbitos gerais e redução de mortes por malária (42%), infecções respiratórias (47%) e desnutrição (20%) entre os ianomâmis. As contratações de transporte aéreo, segundo a pasta, são realizadas conforme a legislação vigente, sob fiscalização dos órgãos de controle.

Leia também: “Moraes na lista dos ditadores“, reportagem de Artur Piva publicada na Edição 280 da Revista Oeste

O post Líderes ianomâmis denunciam, em carta, omissão da gestão Padilha na saúde apareceu primeiro em Revista Oeste.

Fonte: https://revistaoeste.com/politica/lideres-yanomami-denunciam-em-carta-omissao-da-gestao-padilha-na-saude/

Deixe um comentário